Notícia

Varejo, juros e endividamento das famílias

Jorge Jatobá (Artigo publicado no JC)
03 de Novembro de 2025

03 - Nov

Dados da Pesquisa Mensal do Comércio (PMC/IBGE) indicam não só um desempenho medíocre das vendas do varejo ampliado brasileiro no trimestre de junho a agosto deste ano com variações negativas (-4,0%, -2,4% e -2,1%) nestes meses com relação ao mês imediatamente anterior, mas também uma forte desaceleração do seu crescimento no acumulado do ano (0,4%) e nos 12 meses até agosto (0,7%). O varejo ampliado acresce, ao varejo restrito, as vendas da construção civil e de veículos, peças e componentes.

Cabe identificar as causas de tal desempenho no contexto de uma economia em que a taxa de desemprego se situa em nível historicamente baixo (5,6%, em julho e agosto) e apresenta os rendimentos reais do trabalho em expansão (6,1% em 12 meses), apesar da inflação (5,17%) ter desacelerado seu crescimento ao longo do período. Com indicadores tão favoráveis observados no mercado de trabalho seria de se esperar que a demanda pelo varejo apresentasse um bom desempenho, não aqueles apontados acima. Enfim, o consumo das famílias responde por 62% do PIB, medido pela ótica da demanda. O que explica essa aparente contradição

A politica monetária contracionista elevou a taxa Selic para 15% ao ano, cujos efeitos se manifestam no mercado de crédito com alguma defasagem, mas de forma implacável. Juros altos elevam o custo de financiamento de vários bens do varejo, especialmente os duráveis, desestimulando o seu consumo. Se a inflação é de demanda, juros altos inibem o consumo das famílias e os investimentos das empresas. É por isso que o Banco Central sobe os juros. O Objetivo é conter a demanda e, por conseguinte, a inflação. Portanto, o principal suspeito pelos problemas do varejo seria a alta Selic. Mas seria somente ela?

Outra possibilidade é a elevação do endividamento e da inadimplência das famílias que tem registrado patamares históricos movido também por causas estruturais, com ponto de inflexão na pandemia, conforme argumentado em artigo publicado no Blog do IBRE/FGV subscrito por Barreto, Avelino e França em outubro de 2025.Dados recentes mostram que cerca de 80% das famílias brasileiras estão endividadas e em torno de 23,0% estão inadimplentes, um patamar inédito. O endividamento contribui para reduzir a demanda pelo varejo pois significa que fração significativa dos rendimentos do trabalho das famílias estão sendo vazados para o pagamento de dívidas. E que, no caso de insustentabilidade financeira, dívidas não estão sendo pagas por mais de um quinto das famílias. O artigo mencionado indica que no período pós pandemia o endividamento elevado convive com o crescimento dos rendimentos do trabalho e com uma baixa taxa de desemprego, no contexto de juros muito altos.

Há indicações também de mudanças estruturais no mercado de crédito com uma maior seletividade das operações devido à alta inadimplência. Observa-se, de forma consistente, uma tendencia de queda no saldo de créditos concedidos nos últimos 12 meses.

Pagar as dívidas tem sido também um dos fatores responsáveis por saída liquida da poupança da ordem de R$ 78,5 bilhões de reais até setembro deste ano. Sacar dinheiro da poupança para pagar dívidas, compromete o consumo futuro das famílias. E como a poupança também financia o investimento, o próprio crescimento da economia.

Portanto, esses indicadores, reflexos de mudanças de comportamento entre famílias, empresas, financiadores e consumo, evidenciam que o mal desempenho recente do varejo brasileiro esteja sendo impactado por outros fatores que não apenas os altos juros. Endividamento e mudanças no mercado de credito reduzem a disponibilidade de renda das famílias para adquirir bens no varejo, comprometendo o desempenho das suas vendas ao longo deste ano e indicando que talvez não seja apenas suficiente reduzir gradualmente os juros básicos para estimular a demanda, mas também agir nas outras dimensões que a determinam.

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