Notícia

Anatomia da Questão Fiscal

Jorge Jatobá (Artigo publicado no JC)
03 de Setembro de 2024

03 - Set

A formação de uma expectativa negativa sobre o equilíbrio fiscal cria um risco e pressiona os juros futuros tornando mais cara a captação de recursos.

A política fiscal continua na frente do debate macroeconômico no país. A política monetária, por sua vez, gerida pelo Banco Central (BACEN), tem estado sob constantes ataques de Lula e do PT, causando um efeito perverso sobre as expectativas. Lula indicou Gabriel Galípolo para a Presidência do BACEN. O mercado questiona se ele vai ser fiel ao pensamento econômico oblíquo do Chefe do Executivo ou se vai dirigir uma instituição autônoma para conduzir a política de estabilização de preços com base em sólidos princípios monetários imunes às pressões da Presidência da República.

Quanto à questão fiscal, uma das suas facetas reside no orçamento. Com 95% dos recursos alocados sendo de caráter obrigatório (salários e encargos do funcionalismo, custos dos demais poderes, gastos previdenciários, entre outros), sobram em torno de 5% para as denominadas despesas discricionárias entre as quais se encontram os investimentos, o custeio da máquina pública e as emendas parlamentares, objeto de desejo crescente por parte dos senadores e deputados da República. Isso torna o orçamento federal engessado, rígido, dificultando a gestão da política fiscal. Para reduzir as despesas obrigatórias seriam necessárias uma séria reforma administrativa, uma gestão de gastos mais austera de parte dos outros poderes que concentram privilégios e benesses inadmissíveis em sociedade profundamente desigual e uma nova reforma previdenciárias, entre outras iniciativas para melhorar a qualidade e a eficiência do gasto público. Essas providências estão sendo reclamadas pela sociedade e igualmente ignoradas pelos poderes da República.

No que diz respeito às despesas discricionárias, cada vez mais espremidas pelo aumento dos gastos compulsórios, observa-se o avanço das fragmentadas, obscuras e questionáveis emendas parlamentares dos mais diversos tipos que transformam deputados e senadores em figuras assemelhadas a vereadores de municípios pequenos do hinterland brasileiro. As emendas avançaram pari passu ao enfraquecimento do Executivo, especialmente depois do impeachment de Dilma. Fugindo a qualquer lógica que não seja a do clientelismo, essas emendas atendem a interesses fragmentados de agentes políticos espalhados por todo o país. Transformam em poeira dinheiro cada vez mais escasso. Isso reduz os recursos para custeio e para o financiamento direto do investimento público que vem declinando no país à medida em que aumentam as necessidades de melhorar e ampliar a infraestrutura econômica e social. Por essa razão, boa parte dos recursos para financiar os projetos do atual PAC (mais de 50%) dependem de parcerias público-privadas e de concessões. Recorde-se que, devido as mesmas causas, os dois PACs anteriores tiveram baixas taxas de execução (em torno de 12% no PAC I e de 25% no PAC II).

A União, os Estados e Municípios, com algumas poucas exceções, têm apresentado um preocupante declínio na sua capacidade de investir, afetando o crescimento atual e potencial da economia. Isso compromete a taxa de investimento como um todo. O investimento privado, por sua vez, tem tido dificuldades no aporte de recursos devido às incertezas econômicas, tributárias e políticas que geram um ambiente de negócios de risco. O FMI estima que a taxa de investimento do país seja, em 2024, de 15,9% umas das menores entre as principais economias do mundo.

Após a aprovação do arcabouço fiscal que aparenta ter sido concebido às pressas e ter sido resiliente às críticas sobre os seus fundamentos, há uma quase certeza, apesar das inciativas recentes do Ministério da Fazenda, de que as metas fiscais para 2024 e 2025 não serão cumpridas devido à substantiva pressão para elevar os gastos com os diversos programas prometidos na campanha eleitoral de Lula e que estão em execução dede 2023. Essas metas são relativas aos gastos primários que não incluem as despesas com juros.

A formação de uma expectativa negativa sobre o equilíbrio fiscal cria um risco e pressiona os juros futuros para cima tornando mais cara a captação de recursos para financiar a dívida pública que já se encontrava no patamar de 77,8% do PIB em junho de 2024. Aumento de juros eleva os encargos da dívida pública contribuindo para aumentar o déficit nominal que compreende o déficit primário mais os juros

Portanto, um orçamento engessado com volumosas despesas obrigatórias, investimentos públicos comprimidos, o descontrole sobre o volume crescente dos diversos tipos de emendas parlamentares, a pressão para aumentar os gastos públicos aumentando o risco do maior inflação e endividamento que pressionam os juros futuros para cima, são dimensões da política fiscal que preocupam os agentes econômicos. Constituem a anatomia da questão fiscal brasileira.

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