Notícia

A polarização chegou ao Banco Central?

Jorge Jatobá (Artigo publicado no JC)
21 de Maio de 2024

21 - Mai

Durante este governo, o Banco Central (BACEN), na pessoa do seu Presidente, foi constantemente criticado com deselegante contundência por Lula e por lideranças do PT. O motivo da insatisfação era a alta taxa de juros que, no início do ano passado, se situava em 13,75%, patamar necessário, do ponto de vista da autoridade monetária, para controlar a inflação. Com o declínio da inflação, a SELIC começou a cair ao ritmo de 0,5% até a reunião do início de maio quando, por uma apertada votação de 5 a 4, o Comitê de Política Monetária (COPOM) decidiu reduzir a taxa em apenas 0,25%. Até aí tudo bem. Votações apertadas ocorreram no passado. O problema é que o COPOM se dividiu, aparentemente, não por razões técnicas (formato versus conteúdo), mas por afiliação a lideranças políticas, mais precisamente à Bolsonaro (cinco votos de diretores indicados por ele, inclusive o Presidente Roberto Campos Neto) e a Lula (quatro diretores por ele indicados). Não aparenta coincidência. Parece voto fiel a correntes ideológicas opostas. Claro que argumentos técnicos foram colocados por um grupo e por outro. Os dois grupos concordam que o contexto global piorou e que a política monetária precisaria ser mais contracionista. Os quatro diretores indicados por Lula afirmam que se se orientaram pelo Forward Guidance (orientação futura) que tinha sido definida nas reuniões anteriores para evitar um “custo reputacional” para o Banco. Os cinco indicados por Bolsonaro argumentaram explicitamente sobre a dificuldade de ancorar as expetativas de inflação na meta e, portanto que haveria um risco de perda de credibilidade e, implicitamente, viram na mudança dos parâmetros do arcabouço fiscal para 2025 e 2026, um afrouxamento perigoso da política fiscal que tem de ser consistente com a monetária. As duas políticas precisam andar para a frente de mãos dadas. Caso contrário, uma vai puxar a outra para trás com efeitos macroeconômicos indesejáveis.

Lembro que esse placar assustador para os agentes econômicos e financeiros do país ocorreu no contexto de um Banco Central independente, autonomia, aliás, conquistada a duras penas e com muito atraso devido aos temores e ao obscurantismo de alguns setores das esquerdas brasileiras por meio de suas representações no Congresso Nacional. Na recente história brasileira, quando o BACEN ainda não era independente, ocorreram intervenções, por exemplo, da então Presidente Dilma Rouseff e do então Ministro da Fazenda Guido Mantega no sentido de baixarem artificialmente a taxa de juros. Tal intervenção conduziu o país à recessão e à inflação de 2015 e 2016.

O placar da última reunião do COPOM preocupa sobretudo quando se olha à frente, vez que entre os diretores recentemente indicados por Lula está Gabriel Galípolo que, se presume, será apontado pelo Presidente Lula para ser o dirigente máximo do Banco Central. A indicação terá que passar pelo Senado e deverá ocorrer no final do ano quando se encerra o mandato do atual Presidente, Roberto Campos Neto. O que está em jogo é a credibilidade da instituição. A confiança no Banco Central como xerife da inflação é fundamental para que seja bem-sucedido na conquista e preservação da estabilidade de preços, seu principal objetivo e para o qual conta com a “arma” da taxa básica de juros, referência para os demais juros praticados pelo mercado financeiro. Decisões do Banco Central devem ser respeitadas e seguidas. Caso contrário será muito difícil ancorar a inflação na ou em torno de sua meta. Se os agentes econômicos perceberem que as decisões do BACEN serão tomadas por simpatias ideológicas ou por afinidades com o Presidente da República de plantão, sua tarefa será muito difícil de ser cumprida. O próximo Presidente do Banco Central, seja ele quem for, terá que zelar pela independência da instituição e por sua integridade para poder conduzir, com base nos bons fundamentos da política monetária, o país à estabilidade de preços.

A última reunião do COPOM trouxe uma péssima sinalização neste sentido porque introjetou nos agentes econômicos a impressão e o temor de que as decisões do BACEN, daqui para a frente, seriam tomadas não com base nos bons e sólidos princípios da política monetária gerida por uma instituição independente, mas com base em questões políticas e ideológicas que fogem à boa gestão macroeconômica do país e que repousam na visão idiossincrática do Presidente da República de plantão e do seu partido político. A polarização que flagela o país parece ter chegado, infelizmente, ao Banco Central. Espero estar errado.

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